quinta-feira, 1 de setembro de 2011

* Levando luz à escuridão

O Eremita - Led Zeppelin - Fonte: Google.com

Risco um palito de fósforo. Após uma pequena explosão de chama descontrolada, o seguro firme e direciono ao pavio da minha lanterna. Ergo-a, encaixando seu arco em um gancho na parede e a luminária estabiliza uma luz suficiente para enxergar o ambiente ao meu redor. É o meu estúdio. E nele, um cavalete empoeirado ainda segura antigos esboços, amarelados e mofados onde a aquarela, há muito tempo ressecada, tentou colorir.

Aos poucos, caminho no breu em direção a uma janela próxima, para que entre um vento e possa renovar o ar. O cheio característico das tintas ainda divide o lugar com outros elementos odoríficos que mais parecem remeter-se a uma casa antiga abandonada onde antes houvera vida. Também existe tabaco queimado impregnado nas paredes manchadas de nicotina e alcatrão, como gotas de suor que escorreram em dias de intensa umidade.

Emperrada, com um pouco de esforço, a janela cede e ergo seu vidro. O suporte de metal já estava enferrujado, mas como uma asa de borboleta tingido de cor. Ainda segura bem a janela erguida e me detenho a abrir a veneziana, que range com sua madeira envelhecida. O vento agora era livre para entrar. E circular, arrastando consigo aqueles cheiros.

E acima de qualquer cheiro, permeia no ar um aroma de incenso. Tantos anos passados desde a última vez em que um fora aceso, mas sua alma parecia ainda habitar o lugar. De repente me lembrei do velho baú próximo àquele pires com o acúmulo das cinzas desses velhos palitos aromáticos. Como tomado por impulso, fui até ele. Abri, tomando seu conteúdo em mãos, para ser de repente afetado por todas as memórias já esquecidas. Delas, que eram as cartas de tarô.

Coincidência - ou não. Retirei-a do pano que as encobria e a carta que figurava sobre o maço era um Eremita. Por um breve instante olhei sua ilustração. E vi o quanto tempo perdi deixando aquela vida para trás. Eu estava velho, é verdade. Mas como o ermitão retratado também era iluminado por minha lanterna.


Quando levei a carta ao foco da lanterna, fui tomado por surpresa. Na minha mente, vi ali o que precisava ter visto. Estava no ato de riscar um fósforo. Que acendeu como o Ás de Paus e o fogo trouxe a luz para ser levado à experiência. Atear o fogo foi como ser tomado de novo pelo impulso da vida. Da minha remota juventude, do espírito aventureiro, da curiosidade original com a qual olhei para as cartas pela primeira vez - e que me levou a querer saber mais sobre elas!

Agora, eu sentia que era isso o que queria. Ser tomado de novo pelo novo. Sentir em minhas veias a pulsação da jovialidade. Ter de volta o mesmo espírito de outrora. Assim, mesmo com os conceitos enferrujados, lançados em algum lugar escuro da minha mente para esquecê-los, corri com elas para a mesa, empurrei pincéis e tubos de tinta empoeirados, para estender o pano e me entregar para aquela magia. Era tudo o que eu queria, ali. Poder ler de novo as cartas, abrí-las para mim. E ver as janelas do destino que deviam ser abertas, para arejar com ventos novos a vida que recomeçava ali.

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9 comentários:

Zazyel disse...

Meu artista renasce! Salve!

Que a luz dessa sua lanterna nunca mais se apague pela poeira...

Emanuel disse...

*cof, cof*
Era tanto pó que faltava mesmo, uma faxina. Passo a passo, pé ante pé, vamos ver aonde esse pintor nos levará, como agora - nessa mescla de Eremita e Ás de Paus (fagulha consciente que garante o ato). Avante!

João Moreira disse...

Adash,

ação, movimento, renovação, compartilhar, viver e seguir a Jornada... o Mago do Destino assentou praça no Arcano VIIII!

Parabéns!!

Adash Van Teufel disse...

Zazyel, que assim seja!

Emanuel, sim, avante, sem olhar pra trás!

Arierom, muito grato! Vou ver o que o Eremita tem a me mostrar!

Abraços!

Unknown disse...

Adash, adorei a maneira como ambientalizou a tirada do Eremita! Fascinante, leitura simples, forte e empolgante!

Abraço!

Adash Van Teufel disse...

Oi Odir!

Muito obrigado pelo elogio e pela visita! Agora, é dar substância às ideias que forem surgindo!

Abraço!

AugustoCrowley disse...

E que a nova descoberta possa lhe elevar como pessoa, como profissional que és.

AugustoCrowley disse...

E que a nova descoberta possa lhe elevar como pessoa, como profissional que és.

Adash Van Teufel disse...

Flávio,

Vindo de um colega e amigo como você, sou muito grato pelos votos!

Abraços,