terça-feira, 25 de outubro de 2011

* Principado poético

A realeza do tarô nos presenteia com 16 figuras humanas. Um cavaleiro, uma rainha, um príncipe e uma princesa, para cada naipe. Ou, conforme os baralhos, pode ocorrer alteração nos nomes, como o cavaleiro ser o rei, a rainha a dama, o príncipe um valete e a princesa o pajem ou o escravo.

Independente das nomenclaturas, estas 16 figuras retratam 16 tipos de atitudes padrões humanas, assim como tipos de personalidade. Ultimamente, estou estudando a possibilidade da personalidade da pessoa ser retratada em uma carta principal, porém, as 3 restantes, de mesmo nome, mas dos outros naipes, ainda assim falam sobre os padrões de atitudes que toma.

Eu me identifico naturalmente com o Príncipe de Paus. Assim sendo, minha estrutura de personalidade compreenderia a presença dos outros 3, em Espadas, Copas e Ouros. Por sincronicidade da Fortuna, fui apresentado a 4 poesias, que retratam conteúdos relacionados aos Príncipes. Na ordem Espadas (a mente), Copas (as emoções), Paus (a energia/ação) e Ouros (a matéria), compartilho esta visão singular, mas que criou em mim um entendimento dos meus próprios aspectos interiores.

Príncipe de Espadas


Príncipe de Espadas ~ Crowley-Harris Thoth Tarot ~ Fonte: Albideuter.de

AVANÇO AO RETROCEDER


Viagem, bagagem.
Divago em bobagens
... mãos firmes no volante,
pés ágeis.. sigo em frente,
enfrento longa viagem.
À frente, o futuro
Enfrento um passado duro
sigo ao seu encontro.
Seguindo.. viajo para trás
... lembranças, volto no tempo
e, ele para mim jamais!


Rogessi de A. Mendes (Esther). Como publicado em: Luso-poemas.net

Príncipe de Copas


Príncipe de Copas ~ Crowley-Harris Thoth Tarot ~ Fonte: Albideuter.de

POEMA DO NADADOR


A água é falsa, a água é boa.
Nada, nadador!
A água é mansa, a água é doida,
aqui é fria, ali é morna,
a água é fêmea.
Nada, nadador!
A água sobe, a água desce,
a água é mansa, a água é doida.
Nada, nadador!
A água te lambe, a água te abraça
a água te leva, a água te mata.
Nada, nadador!
Senão, que restara de ti, nadador?

Nada, nadador.


Jorge de Lima. Do livro: "Poemas - Jorge de Lima" [selecão de Gilberto Mendonca Teles] , Global Editora e Distr. Ltda, 1994, SP

Príncipe de Paus


Príncipe de Paus ~ Crowley-Harris Thoth Tarot ~ Fonte: Albideuter.de

ENCARA O DESAFIO DO TEU JEITO


Levanta a mente do corpo calado
Acorda os pensamentos corretos
Que o dia já anda acordado

Encara o desafio do teu jeito
Como mesmo fosse a coisa última
A ter no mundo o teu conceito

A coisa se faz com cuidado...
A coisa se faz com respeito...
Não se faz a coisa forçado...

Que tua alma voará num céu eleito
Que o dia aclarará a tua vida
Que vida brotará no teu peito

E a coisa vai ser para ti
O que sempre imaginaste
Que a coisa seria em si:

Menos força, mais jeito.


Gê Muniz. Como publicado em: Luso-poemas.net

Príncipe de Ouros


Príncipe de Ouros ~ Crowley-Harris Thoth Tarot ~ Fonte: Albideuter.de

PEDRAS, PÉTALAS... PÓ.


Nas ruas da nossa vida
Pisamos pedras rolantes
Que nos levam à porfia
De caminhos tão errantes!

Às vezes temos guarida,
Às vezes, deambulantes,
Não passamos de vadios
Meras sombras caminhantes...

E as pedras do caminho
Podem ser pétalas soltas
Aos pés do nosso destino...

Ou armas de arremesso,
Se deixarmos as revoltas
Revelarem o avesso.

"Pedras a quem me confesso,
Cumpridas todas as voltas,
Sereis só pó, no regresso..."


Teresa Teixeira (Videira). Como publicado em: Luso-poemas.net

-> Clique para ver postagens semelhantes.

domingo, 23 de outubro de 2011

* Nada mudou, mas tudo

O Mundo ~ I Tarocchi del Rinascimento ~ Fonte: Albideuter.de

Às vezes, por demais até, tento controlar o incontrolável. Talvez seja orgulho da minha parte, sei disso. Não admitir que sou apenas uma pessoa comum, presa ao vai-e-vem da Fortuna. E, dada a minha natureza, acredito que a reação nem sempre é muito saudável.

Reavaliando pontos-de-vista. Creio que esse meu ano tem me ensinado isso. Em determinados aspectos, aprendi bem e continuo seguindo promovendo transformação. Mas, no que tange principalmente à presença de outras pessoas, as dificuldades são reais. O mundo dos relacionamentos não é fácil, seja a nível profissional, pessoal, social, amistoso ou afetivo. Cada pessoa é um desafio, é uma esfinge, é um mistério a ser desvendado e, conforme o desafio, reajo em busca das respostas.

Mas tem horas que tudo o que quero é poder deitar em um leito gramado, o chão acolchoado e acolhedor da Terra. Poder encarar o pôr-do-sol, deixar as memórias boas do dia seguirem seu rumo e olhar para um céu que me inspire ao anoitecer, um céu estrelado, para viajar na esperança de alcançar meus sonhos, enquanto olho As Estrelas.

Eu ainda tenho pouco a dizer. Muito a sentir. Muito a expressar. Mas as pequenas experiências, os pequenos gestos, devem ser vivenciais. Sentidos na Alma. Para que minha Alma me mostre o sentido.

E hoje é o que venho fazer. Uma música de pôr-do-sol. De olhar um céu estrelado. De esperar para que a vida mostre seu caminho, descortine a estrada e rezar à Deusa para que minhas pernas permaneçam fortes e prossigam caminhando. Quero deixar de ser Atlas e tentar carregar O Mundo comigo. Apenas para vivê-lo, como ele é, por si mesmo. Comunhão.

Assim, sou pão, sou paz, sou mais. Gratidão, à Alma, pela jornada. E por cada uma das pessoas que cruza o meu caminho, como verdadeiros Mestres, sempre aprendo. E sigo aprendendo.


Soy pan, soy paz, soy más



"Soy Pan, Soy Paz, Soy Más" ~ Versão de Mercedes Sosa & Piero ~ Original: 1981 ~ Composição: Piero De Benedictis ~ Tradução: Letras.com.br


Yo so-o-oy, yo so-o-oy, yo so-o-oy
Eu sou, eu sou, eu sou
soy agua, playa, cielo, casa, planta,
sou água, praia, céu, casa, planta,
soy mar, Atlántico, viento y América,
sou mar, Atlântico, vento e América,
soy un montón de cosas santas
sou um monte de coisas santas
mezcladas con cosas humanas
misturadas com coisas humanas
como te explico... cosas mundanas.
como posso dizer... coisas mundanas.

Fui niño, cuna , teta, techo, manta,
Fui menino, berço, peito, teto, cobertor,
más miedo, cuco, grito, llanto, raza,
e medo, bicho-papão, grito, choro, raça,
después mezclaron las palabras
depois mesclaram as palavras
o se escapaban las miradas
ou escapavam-se os olhares
algo pasó... no entendí nada.
algo aconteceu... não entendi nada.

Vamos, decime, contame
Venha, me diga, me conte
todo lo que a vos te está pasando ahora,
tudo o que está lhe acontecendo agora
porque sino cuando está el alma sóla llora
porque senão quando fica a alma sozinha, chora
hay que sacarlo todo afuera, como la primavera
tem que pôr tudo pra fora como faz a primavera
nadie quiere que adentro algo se muera
ninguém quer que lá dentro alguma coisa morra
hablar mirándose a los ojos
falar olhos nos olhos
sacar lo que se puede afuera
pôr tudo que puder pra fora
para que adentro nazcan cosas nuevas.
para que nasçam dentro coisas novas.

Soy, pan, soy paz, sos más, soy el que está por acá
Sou pão, sou paz, és mais, sou o que está por aqui
no quiero más de lo que me puedas dar, uuuuuuh
não quero mais do que possas dar-me
hoy se te da, hoy se te quita,
hoje te dão, hoje te tiram,
igual que con la margarita... igual al mar,
que nem se faz com a margarida... igual ao mar,
igual la vida, la vida, la vida, la vida...
igual à vida, a vida, a vida, a vida...

Vamos, decime, contame
Venha, me diga, me conte
todo lo que a vos te está pasando ahora,
tudo o que está lhe acontecendo agora,
porque sino cuando está el alma sóla llora
porque senão quando fica a alma sozinha, chora
hay que sacarlo todo afuera, como la primavera
tem que pôr tudo pra fora como faz a primavera
nadie quiere que adentro algo se muera
ninguém quer que lá dentro alguma coisa morra
hablar mirándose a los ojos
falar olhos nos olhos
sacar lo que se puede afuera
pôr tudo que puder pra fora
para que adentro nazcan cosas nuevas. (BIS)
para que nasçam dentro coisas novas

cosas nuevas, nuevas, nuevas . . . nuevas
coisas novas, novas, novas... novas

-> Clique para ver postagens semelhantes.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

* O amor, a música e o tarô

Fortuna ~ Crowley-Harris Thoth Tarot ~ Fonte: Albideuter.de

Talvez, uma das coisas mais contraditórias que poderia-se afirmar sobre o Arcano X, Fortuna, ou a Roda da Fortuna, é que ela trata de um nobre e velho sentimento conhecido, o amor. Qualquer tarólogo derrubaria meu argumento em dois segundos, faria vista grossa ou poderia me acusar de liberdade de interpretação ou rearranjo simbólico.

Ainda assim, após reflexões contínuas, vou exercer meu direito de teimosia e talvez descortinar um símbolo tão enigmático como a esfinge ou então que se torna tão evidente no momento em que o ser é tomado pela flecha do cupido, apaixona-se e, em poucos reveses, permite-se mergulhar no amor.

É mais do que óbvio relacionar o amor ou o apaixonar-se ao Arcano VI, Os Amantes ou O Enamorado. Talvez pelo próprio simbolismo clássico retratar uma escolha entre duas pessoas, dois caminhos ou, em outros baralhos, um casamento alquímico sendo realizado. Mas a obviedade se encerra dentro de um limite contextual.

Afinal, para haver dúvida é preciso haver opções. Para namorar, é preciso haver um parceiro para você. O pacote está pronto aqui. A panela já estava fervendo, com água, sal e óleo, só falta agora colocar a massa e cozinhá-la por 8 minutos ou até o ponto desejado. Enquanto em outra, o molho acompanhante está prestes a evaporar todo seu excesso de água e atingir a cremosidade ideal. Que o molho cobrirá abundantemente a massa e o conjunto salpicado por queijo, isso até quem não sabe fritar um ovo já está careca de saber. Eu, pelo menos sei que não estava com fome enquanto escrevia este post.

O simbolismo do Arcano VI se encerra em si mesmo e contextualiza todo o decorrente. Mas não explica como é que tudo funciona em si. Não explica como foi preparado o molho (ah, comida de novo não!), ou melhor, não explica como os elementos envolvidos na questão foram levados àquele "status quo". Então, o que realmente implica no antes, no agora e no depois, cujo resultado se dá numa escolha ou casamento, simbolizado na carta em foco?

O Enamorado ~ Spanish Tarot ~ Fonte: Albideuter.de

Da cozinha, vou apelar para a História. Na época em que se tem notícia do surgimento do tarô na Europa medieval, a questão dos relacionamentos afetivos eram muito importantes no quesito em que representavam a união política de duas entidades familiares (leia-se aqui as que detinham algum impacto social, ou seja, a corte que predominava naquelas regiões!). Casamento era, nesse contexto, um acordo comercial, onde a união dos herdeiros representavam sempre um lucro para as famílias envolvidas. Seja a conservação das fortunas conquistadas, dos bens materiais, seja a aquisição de títulos, havia sempre um interesse por detrás da escolha e a que fosse mais conveniente para os envolvidos era realizada. A vontade própria, do casal a ser unido, não era levada em consideração.

Ainda hoje, passado seis séculos do surgimento do tarô, há interesse envolvido nos relacionamentos e não raro pais forçam seus filhos em direção à determinada pessoa X ou pessoa Y. Logo, não é difícil associar a simplicidade do símbolo clássico d'O Enamorado. Ele está em dúvida entre exercer a escolha feita por conveniência, unindo-se à quem fora anteriormente "vendido" dentro da tradição (O Hierofante ou O Papa, arcano V) ou unir-se à donzela que ele conheceu um dia, por acaso, onde ela era uma "pobre camponesa do campo que ia todos os dias ao bosque colher lenha" e ficou "ENAMORADO"! Em outros termos, encantado - simples assim. Ele seria muito sortudo mesmo se a donzela prometida fosse aquela por quem se encantou.

Agora imagine que o pobre moço tenha que escolher entre o amor de sua vida e a conveniência imposta pela tradição. Por isso o tarô mostra ele unindo-se a uma (a da tradição), enquanto olha para a dama-objeto de sua vontade, que é deixada para trás. Mas claro, se ele resolvesse escolher de fato por sua vontade e pela verdadeira amada, o veríamos vestindo uma armadura de coragem no arcano seguinte, disposto à lutar, n'A Carruagem, arcano VII.

Se seis séculos se passaram, sempre com a repetição das mesmas histórias, mudando apenas as personagens envolvidas, nada mais justo do que deixar de se preocupar se eles se casaram ou compraram uma bicicleta e voltar à pergunta inicial: Qual foi a motriz dos fatos, que desencadeou a escolha e os fatores em questão?

Veja bem. Ao descrever as circunstâncias explicativas acima, coloquei algumas palavras em negrito, cujos significados são automaticamente associados à tão enigmática Roda da Fortuna. Se explicada, fala sobre ciclos, alternância, sobre movimentos de mudança, ação e reação, surpresa, ser pego pelo inesperado ou arrastado pelas circunstâncias. Mas esta é a roda do destino. Boa ou má fortuna são resultados possíveis, dependendo somente das ESCOLHAS.

Mas a forma de me fazer entender é falar de modo a tocar o seu coração, para que não reste dúvidas de que amar alguém é obra do destino. E o modo que escolhi para fazer isso é, através de uma série de músicas, exemplificar de forma prática. Pronto para uma viagem musical? Então pressione Play, abaixo.


Tudo começa com Ana Carolina, em Carvão (2006, Álbum Dois Quartos, Sony BMG). O futuro enamorado é apenas um jovenzinho quando a Roda da Fortuna começa a agir. E sobre fatores absolutamente tachados como coincidência, a sincronicidade o leva a ver pela primeira vez os olhos daquela pessoa por quem se apaixonará.

"Surgiu como um clarão, um raio me cortando a escuridão" o desperta para aquele olhar, que lhe causa um inexplicável interesse "e veio me puxando pela mão por onde não imaginei seguir". Surge sentimento intenso e inexplicável, um misto de assombro, interesse e medo, o que coloca toda a estrutura racional em conflito e termina nele, se questionando, "não sei quem é você". A Fortuna lhe pegou, meu caro jovem. E você foi encantado.


A curiosidade, que tomou conta, o impulsionará automaticamente à comunicação. Ele vai querer se aproximar, cercar-se da pessoa e de alguma forma, vai querer satisfazer sua curiosidade. E o diálogo, explícito, será trivial, porém, implícito, estará a intenção. A comunicação verbal e não-verbal ocorre, sendo que nenhuma música poderia melhor para retratar tal momento do que I've Got This Friend (2011, Álbum Barton Hollow, Produtor Charlie Peacock), da dupla The Civil Wars.

Uma apresentação onde cada um fala de si mesmo em uma imagem fictícia de uma terceira pessoa e termina com a conclusão de que "ela parece adorável" e "ele parece surgido diretamente de um sonho". Já entregue à necessidade do enlace, nosso enamorado entende que "seria uma pena se eles não se encontrassem", pois ali entenderam que são "a pessoa certa" um para o outro. Fortuna, meu caro enamorado, te conduziu. E te enredou.


E a Fortuna, inevitável, acontece. O beijo, tão esperado. A troca entre duas almas, o contato, selado ali, lábio tocando lábio. E a química entre ambos se expressa. O instinto aflora e toca o ser num nível que vai além do emocional. "Voltar aos dezessete, depois de viver um século" é a sensação causada, pois nada que houve antes importa mais e ali tudo recomeça. Os lábios "vão se envolvendo, envolvendo, como a hera sobre o muro" e o sentimento "vai brotando, brotando, como o musgo sobre a pedra".

O corpo alquímico está se transformado, os olhos percebem tudo como se estivessem tingidos de rosa. A respiração aumenta, o coração dispara. Hormônios são lançados no sangue "com todo seu colorido tem passeado por minhas veias". Medo se intensifica em "meu passo retrocede quando o teu avança" mas a certeza atinge o interno na "arca das alianças penetrou em meu ninho". É Volver a Los Diecisiete (original de Violeta Parra, 1966, Álbum Las Últimas Composiciones, RCA Victor), interpretada maravilhosamente por Mercedes Sosa e Milton Nascimento.


Os lábios desgrudam, o olhar do enamorado se vê em outro mundo. "Você faz meu coração bater mais rápido" e ele sai de si mesmo. Toda uma imensidão de detalhes se torna perceptível em sua visão, como se enxergasse o mundo pela primeira vez. "Você me vira ao contrário, até eu não poder mais me controlar", é cantado em Faster (2011, Álbum Modern Love, Produção Mark Weinberg and Matt Nathanson, Marshall Altman), de Matt Nathanson.

Uma espécie de euforia misturada à timidez toma conta e a Roda da Fortuna gira velozmente em seu peito. "Você tem o sabor da luz do sol e de chiclete de morango", pensa, alucinado, tentando descrever pra si mesmo sua própria experiência. Entregue ele está, "você me domina" e agitado, "pois eu pulo, caio, rastejo, imploro, roubo, vigio". Agora o limite de si mesmo foi ultrapassado. Quer consumir-se no corpo encantado que vê em sua frente. E o enamorado se vê, rodopiando com a Roda (da Fortuna).


Ansiedade, pele, cheiro, toque, feromônios. A Roda da Fortuna, girando velozmente, faz o enamorado perder o controle mental. Sua persona é tomada pelo seu animal interno, puramente instintivo e a luxúria começa a tomar conta de si. "Você... seu sexo está em chamas". "Lábios macios estão abertos". "Quente como uma febre, ossos tremendo, eu poderia apenas provar." A libido está aflorada e há mais a se descortinar.

É chegado aquele momento intenso. Do rosa, o tom perceptível pelos sentidos beira o vermelho. O calor dos corpos aumenta. E o enamorado se torna "consumido com as palavras que você transpira", em Sex on Fire (2008, Álbum Only by the Night, RCA), da banda Kings of Leon. O movimento, o sobe-e-desce, a velocidade, o descontrole. É a ação do Arcano X, a Fortuna, a Roda da Fortuna, a unir Os Amantes, a torná-los um só. E concluir sua ação.

Aonde terminará essa viagem? Não está escrita no destino. O destino fez sua parte, os colocou frente à frente. Sem escapatórias. Tirou-lhes o fator racional e controlado para lançá-los em uma jaula, como feras instintivas, que são. Sem máscaras, apenas viventes. Puro sentimento. Então, à partir de agora, são escolhas. Deste passo em diante sim, terá-se que decidir qual o melhor caminho a seguir. E então, verdadeiramente, inicia-se o processo do arcano VI.

Uma vida juntos? Uma vida separados? Apenas um momento? Uma entrega? As possibilidades são ilimitadas. E não se resumem apenas em escolhas banais. Para concluir a viagem musical, um último vídeo. Love The Way You Lie (2010, Single, Produção de Alex da Kid), por Eminem e Rihanna, retratando o mais puro instinto, o fogo que consome os amantes. Amor e ódio fundidos e soltos na animalidade.


Eu, Adash Van Teufel, prefiro correr o risco de provar o sabor do beijo à beber do amargo da dúvida. E você, o que prefere? Arrisca-se à Fortuna ou segue pelo que lhe parece conveniente? Pense à respeito!

-> Clique para ver postagens semelhantes.

sexta-feira, 14 de outubro de 2011

* Encontrando a certeza

O Pendurado ~ Golden(es) Botticelli Tarot ~ Fonte: Albideuter.de

De repente abri meus olhos. Meu corpo estava tão dormente que parecia anestesiado. O que me fazia pensar por quanto tempo estava daquele jeito, naquela mesma posição. Tentei me mover sem forçar e percebi que não conseguia mexer um só músculo, totalmente exaurido de energia, totalmente cansado pela dor. A dor percorrera da cabeça aos pés, parecia sentí-la até nos fios de cabelo esticados pela gravidade em direção ao solo.

Sem conseguir me mover, olhei para cima - e tudo o que vi foi o gramado verde onde se sustentavam dois troncos. Ambos desciam em direção aos céus, sendo unido em seu cimo-raiz por mais um. E era neste, fatídico, onde uma corda me suspendia. Eu estava pendurado pelo pé. Há tanto tempo que já não sabia sequer mais como executar qualquer movimento.

Perdi a referência do que era acima e do que era abaixo. E dizem que todo o cristão verdadeiro anseia pelo céu. Meu céu, ali, totalmente gramado, fazia sentir-me o pior dos pecadores, pois alcançá-lo era o desejo impuro de apenas poder voltar ao solo.

Por um momento, pensei que o sangue pressionado em minhas veias descendo em direção à cabeça estava me fazendo ter alucinações. Estar ali, vendo tudo de cabeça para baixo, me desorientava. Nem quando criança, a brincar, plantando bananeiras contra o solo, em meio à brincadeiras com amigos, sentia toda aquela agonia. Não imaginei que o que era uma diversão pueril poderia virar castigo de adulto. Um castigo que, ali sofrendo, não desejava a ninguém mais.

O dia, ensolarado, estava tomado por uma brisa refrescante, daquelas românticas de final de tarde, que esvoaçam cabelos no encontro de amantes e compunham um cenário perfeito, salvo o fato que, ao tocar minha pele dolorida, era como se milhares de alfinetes me encostassem ao mesmo tempo. O que só piorava, ao invés de me dar algum alívio.

Se desgraça pouca era bobagem, minha mente percebeu-se de repente invadida por sons. Pessoas passavam e gargalhavam da situação. Riam de mim, riam daquela humilhação pública. Pois, afinal de contas, todos sabiam. Um homem pendurado em público era acusado de algum delito qualquer, não importava se fosse culpado ou não. Inútil nesse instante era bradar por inocência, pois para todos, ali estava alguém a quem culpavam por sentirem-se eles mesmos injustiçados pela vida. Ou seja, o homem pendurado, quer quisesse ou não, era tido como o traidor, o grande vilão.

O vento começou a fortalecer e levemente me balançar. O vai-e-vem do meu corpo suspenso começou a me deixar tonto. O contato da corda com o tronco fazia a madeira ranger. Àquela altura, o som era agoniante. E a tristeza tomou conta de mim, pois nada mais podia fazer. Sem resistir, deixei o pranto rolar e quando as lágrimas cessaram, fui invadido por um torpor interno. Nada mais poderia ali fazer, pois já não dependia de mim sair daquela situação.

No fundo, sabia que não era culpado. Mas estava ali, pagando o alto preço. Então, sem pestanejar, senti meu coração. Ele não parara de bater. Eu ainda estava vivo e o sangue prosseguia fluindo em minhas veias, como a água represada que não cessaria de molhar a mão que fosse tocá-la. Então, num súbito acesso de fé, concentrei-me nas batidas e apenas pedi o que minha boca teve tanta dificuldade em ali pronunciar: "Misericórdia". Misericórdia de mim, pois sou inocente.

O Pendurado ~ Golden Dawn Tarot ~ Fonte: Albideuter.de

Subitamente, as gargalhadas cessam, junto com a dor. A cena se transfigura e o chão gramado, acima de meus olhos, transforma-se em um grande mar. Não sem me causar espanto. E então percebo estar suspenso entre rochas, acima das águas ondulantes. Meus ouvidos, agora intoxicados pelo som do mar, ouvem a voz, que mais parece um sussurro:

- Por que deixaste o orgulho causar-te tanta dor? Robusteces o peito e infla-o com um ar de soberba, com qual finalidade? Pois cada passo que tu dás não te libertas da fera anterior que antes domei com o toque do amor? Por acaso não terá sido eu a te dar alegria?

Reconheci aquela voz, vinda dela, atrás de mim. E entendi. Estava dormindo novamente, sonhando com aquele enredo, que antes parecia tão real. Era ela, a mesma bailarina que me domou, quando sonhei estar no circo. Sua voz era de tamanha delicadeza que parecia música aos ouvidos e tão suave como o toque que, no outro sonho, tocara minha juba.

Princesa de Copas ~ Via Tarot ~ Fonte: Albideuter.de

Então ela deu passos em minha frente, como que flutuando sobre as águas. Percebi seus pés delicados, seu vestido brilhante de pura luz e, em sua mão, uma taça. Sua expressão era tão juvenil e inocente, que mais parecia uma menina a uma mulher. Olhando-a, com dificuldade, pude lhe dizer:

- Quem é você?

- Sou aquela que habita teus mundos internos. Sou aquela que está no início e te conduz ao fim. Meu nome é, em teu vocabulário, Alma. Meu dever, para contigo, é mostrar-te tuas próprias falhas, para que tu mesmo possas corrigí-las.

- E por que estar agora, aqui, expiando aquilo que parece ser os meus pecados?

- Porque anseio pelo momento em que tu entregarás tuas próprias defesas. Eu vim na manhã, nas lâminas do teu tarô, pedindo-te tudo. Nada mais deve restar aqui, em teu mundo interior. A isto chamo recomeçar. E tu pediste a misericórdia, agora. Se estiveres disposto ao recomeço, levo-te à libertação. Renda-te, não há outra saída.

Acenei afirmativamente, com a cabeça. Seu vestido de luz se escureceu. Seus delicados pés tornaram-se esqueléticos e sua taça tornou-se uma foice, segura por mãos de ossos, sem pele ou carne. E tão rápido quanto a foice cortou a corda que me suspendia, caí no mar, em um mergulho vertical. A água foi como um bálsamo de alívio e cura. Foi como puro amor, o colo de uma mãe, uma canção de ninar, que apenas me convidou a adormecer. Não sem despertar, de sobressalto, com o apito do trem, chegando na estação onde eu deveria descer.

O trem parou. Guardei a carta do Louco que ainda segurava em minha mão. Peguei a mochila e levantei, indo em direção à porta. As coisas agora pareciam fazer sentido. Um sentido inexplicável e diferente. Eu fui sim ao encontro do amor. Mas ela me encontrou primeiro, me trazendo o amor. A Alma. E agora, sabia que poderia descer seguro, pois meu coração estava cheio de certeza. Certeza acompanhada pela voz, em minha mente, lembrando Gerd Ziegler e o Espelho da Alma:

"Os quatro querubins sopram o espírito que tudo penetra em todas as quatro direções. Vê, tudo é novo!"

------
ZIEGLER, Gerd. Tarô espelho da alma. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1993, p. 72.

-> Clique para ver postagens semelhantes.